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Abr/06

“Mantemos as qualidades de um bom sector mineiro”

Notícias
| 22 Abril de 2006

A EDM – Empresa de Desenvolvimento Mineiro com capital social 30 milhões de euros – é uma sociedade que tem actualmente como linha de orientação principal a reabilitação ambiental de zonas mineiras. Sociedade de direito privado, com maioria de capitais públicos, a EDM tem tentado estar sempre do lado da indústria extractiva como um apoio de sucesso.

Em entrevista ao «Primeiro de Janeiro», o presidente do Conselho Executivo da empresa, Delfim Carvalho, dá o mote para os próximos dois anos do sector e todas as vicissitudes do mercado actual dos minérios.

O que será feito no ano de 2006 neste sector da indústria extractiva e o que está nas mãos do EDM para ajudar ao desenvolvimento do sector mineiro em Portugal?
A principal actividade da EDM é a reabilitação ambiental das zonas mineiras degradadas, a qual sofreu grande impulso graças ao empenho do Governo em se cumprir e levar a bom termo o Programa definido com o Decreto-Lei 198-A/2001, de 6 de Julho. Assim, nestes últimos tempos foram já iniciadas várias obras, após os necessários estudos de caracterização, elaboração de projectos e EIA. De todas elas, a obra da Barragem Velha na Urgeiriça é a mais importante e foi consignada na sequência de concurso internacional. O empreiteiro já está no terreno há algum tempo e, a obra, que se afirma como chave para a reabilitação ambiental da área da Urgeiriça, vai ficar concluída no próximo ano. Na Barragem Velha estão acumulados mais de dois milhões de toneladas de resíduos. Estamos também com obras nas minas de Argozelo, em Jales (efluentes), Algares (Aljustrel) e vamos lançar concursos para as obras em Covas, Montesinho e, possivelmente, Terramonte. Estas intervenções irão minimizar, ou anular, riscos de contaminação e maximizar a segurança criando assim um novo contexto ambiental enquadrável e mais consentâneo com os ecossistemas das regiões onde se localizam.

Para além da actividade ambiental, temos também um projecto com ligação à Somincor para a prospecção de uma área na Faixa Piritosa, cujo contrato está para ser formalizado brevemente, e no qual depositamos grandes esperanças. Trata-se de um projecto de prospecção mineira com qualidade e ambição. Temos fundadas expectativas para se poder vir a descobrir um jazigo do tipo Neves Corvo. Seguramente as eventuais descobertas situar-se-ão a profundidades relativamente grandes em relação ao conhecido. Esta é uma nova fase que terá de ser sistematicamente desenvolvida na Faixa Piritosa. Há muito que a vimos defendendo. Vem a propósito referir que, muito recentemente na reunião do PDAC 2006 em Toronto, onde estavam representadas mais de 700 empresas, para além de organismos e outras entidades de todos os cantos do mundo, também foi defendida a passagem a uma nova fase virada para a prospecção de níveis mais profundos da famosa Abitibi Belt, onde ocorre o célebre jazigo de Kidd Creek, semelhante ao nosso Neves Corvo, ambos de classe-mundial.

Este dado vem reforçar a convicção de que enquanto não estiverem devidamente prospectadas e avaliadas as áreas geologicamente potenciais para a descoberta de jazigos do tipo Neves Corvo, o qual já produziu, do “nada”, mais de 2,5 mil milhões de euros e pode ainda vir a gerar outro tanto, ou mais, não se pode parar, ou deixar entregue apenas à imprevisível e volúvel iniciativa de terceiros a prospecção mineira na Faixa Piritosa.

Há um grande optimismo na descoberta de novos jazigos de minerais em Portugal?
HHá bastante optimismo. Se assim não fosse as empresas não decidiam investir numa actividade que é, obviamente, de grande risco. Se me perguntarem se estou optimista quanto a futuras descobertas de jazigos, responderei que sim, desencadeadas que sejam as adequadas iniciativas nesse sentido. Há fundamento de base científica credível para afirmar que existem condições para que essa descoberta possa acontecer mais tarde ou mais cedo. Ela dependerá do mérito, saber, determinação, perseverança e, inclusive, do factor sorte. É uma questão de tempo. Como se sabe, as empresas que vêm a seguir para estudar áreas ou alvos libertos ficam em vantagem relativa e, não raras vezes, acabam por descobrir, com o mínimo de custo e esforço, o que outros prematuramente abandonaram.

Quais são os minerais que estão a ser explorados no terreno?
A Faixa Piritosa é conhecida pela sua riqueza e abundância em sulfuretos polimetálicos (cobre, zinco, chumbo e estanho). Agora também há interesse no Índio, metal do século XXI que abunda nalguns destes jazigos, caso de Neves Corvo. O Índio está a ter grande procura por ser fundamental no fabrico dos écrans planos dos televisores e computadores.
No resto do país há, actualmente, projectos de prospecção para o ouro e para níquel. Na prospecção do ouro há também muito para fazer no país.

Estamos provavelmente numa altura de maior esplendor dos últimos tempos no sector mineiro, o chamado «boom» mineiro?
Não me parece que se possa falar de um «boom», mas sim num ressurgimento do interesse nos recursos geológicos. Nestes dois últimos anos, vimos um disparo vigoroso das cotações da generalidade dos metais, designadamente cobre, níquel, ouro, prata, volfrâmio, estanho, urânio, e, mais recentemente, zinco e chumbo, alguns deles atingindo valores máximos históricos. Tudo isso devido ao impressionante crescimento da procura na China e na Índia. Isto só aconteceu agora, mas podia já ter aparecido muito mais cedo. Há muito que se sabia que quando os países mais populosos, com baixo nível de desenvolvimento, aumentassem, por pouco que fosse, o seu consumo per capita de metais, o impacto na procura e aprovisionamento seria de grande magnitude com reflexos nas respectivas cotações. A surpresa foi a sua subida súbita. Acontece que a somar a tudo isto há que contar com a nítida quebra no ritmo de descobertas de grandes jazigos á escala mundial.

E estes preços excessivos irão manter-se por muito mais tempo?
Sim, eu creio que, apesar de ser provável verificarem-se alguns ajustamentos, eles se irão manter a cotações elevadas. Na reunião do PDAC, considerada a maior de sempre (mais de 12 mil participantes), vivia-se um ambiente de completa euforia, após longos e penosos anos em depressão de mercado. Este ânimo arrasta empresas para investir no sector mineiro. Há um ressurgimento também de outros metais, como é o caso do urânio. Só na famosa bacia do Athabasca (Canadá), famosa pelos anomalamente altos teores dos seus jazigos, apareceram, de um ano para o outro, mais de 80 empresas a prospectarem urânio. A generalidade dos analistas prevêem que, a médio prazo, este panorama do sector dos metais se irá manter, pese embora algumas correcções pontuais. Quando as cotações aumentam, a prospecção e pesquisa, que é o “sangue” da indústria mineira, também cresce. No nosso país os reflexos deste novo quadro são notórios. A mina da Panasqueira viu ressurgir a sua rentabilidade, aumentou as reservas e sofreu novo impulso para mais anos de vida. Para a mina de Aljustrel, parada desde 1992, já foi anunciada a intenção de retomar a lavra pela Eurozinc, agora essencialmente virada para o zinco. Ao que sabemos, o urânio de Nisa tem vindo a despertar interesse em algumas empresas e poderá, porventura, também vir a ser alvo de um projecto de exploração. Há, efectivamente, mais interesse pelas minas em Portugal, contrariando assim a opinião dos que pensavam que o sector já pouco teria a oferecer.

QQual é a sua opinião na activação da exploração e pesquisa do urânio no nosso País?
Quanto a isso, há que fazer uma clarificação de ideias. Toda a actividade mineira tem maior ou menor impacto ambiental, e o urânio é um caso particular por razões óbvias. A sua exploração exige, em comparação com os outros casos, medidas adicionais de remediação e de rigor no controlo ambiental durante e após a exploração, podendo, inclusive, arrastar-se por muitos anos.
O facto de haver custos adicionais na componente ambiental pode fazer com que a exploração de certos depósitos seja, bem feitas as contas, anti-económica. Este é o caso da generalidade dos depósitos conhecidos em Portugal, à excepção de Nisa, para as cotações actuais e caso o respectivo projecto passe nos estudos e avaliações de impacto ambiental.

Em que aspecto podemos considerar essa situação. A EDM tem um papel fundamental no equilíbrio do ambiente nesta situação…
Claro que, se isso for conveniente e necessário, poderemos vir a desempenhar o nosso papel. Mas não devemos sobrepor-nos às iniciativas privadas. A intervenção de uma empresa como a EDM não é a de operador mineiro. Tal não significa que, caso o accionista assim o entenda, por razões estratégicas ou outras, não possa vir a ser chamada a ter uma participação, necessariamente, minoritária em certos empreendimentos mineiros.

Um dos exemplos de grande mudança em termos económicos e ambientais aconteceu com as minas da Panasqueira. Há algum interesse de fazer com que outras minas abandonadas possam ser reconvertidas, tal como esta?
Importa, antes de mais, precisar que a mina da Panasqueira nunca foi abandonada, como se pode depreender da sua questão. Passou sim por um período de dificuldades, face à baixa cotação do volfrâmio durante anos a fio.
Não estou a ver casos que, para além dos já citados atrás, possam, no quadro actual, vir a ser relançados na exploração. Todavia, se a sua pergunta tem implícita a reconversão da área mineira decorrente da reabilitação ambiental, pode afirmar-se que ela visa a revalorização e aproveitamento das áreas reabilitadas. Nessa medida estamos em crer que irão surgir alguns projectos de índole turística aproveitando a componente lúdico-cultural, nas áreas que tenham historial, relevância e massa crítica para tal fim. Posso adiantar, entre outros, os casos da Urgeiriça, Aljustrel e S. Domingos. De sublinhar que já está em fase avançada um projecto desta natureza nas antigas minas do Lousal e da iniciativa do antigo concessionário mineiro. A EDM participa na reabilitação ambiental.

Nessas minas que terão reconversão, poderá haver algum tipo de prospecção mineira novamente?
É claro que quando estabelecemos projectos de reconversão não se inviabiliza essa possibilidade de prospectar, mas normalmente essas minas já foram intensamente exploradas anteriormente, por isso, é improvável que nelas exista algum tipo de minério economicamente recuperável e também não é de esperar aí grandes novidades em termos de descobertas mineiras. Os projectos de reabilitação ambiental não colidem com os projectos de prospecção e, além disso, a DGGE é sempre chamada a pronunciar-se em todos os projectos de reabilitação ambiental nas áreas mineiras abandonadas.

Estes projectos ainda têm outra componente, o de potenciar económica, social e culturalmente, os locais onde as minas estão localizadas?
A memória histórica que nessas regiões prevalece da actividade mineira, dos mineiros e dos minérios constitui, quase sempre, uma lembrança positiva dado o impacto que tiveram na respectiva economia. Por isso, com a reabilitação destas minas abandonadas, tudo se complementa e os interesses são convergentes para a busca de valorização futura. Há vários casos em Portugal, como já referi, por exemplo, o do Lousal, de S. Domingos, em Mértola, e de Aljustrel. É claro que as autoridades locais têm muito a ver com o potencial a desenvolver, facilitando a integração e assimilação dos projectos de recuperação e valorização ambiental nos contextos regionais, e contribuindo para que as empresas ou entidades envolvidas neste âmbito tenham a ajuda possível para os concretizarem da melhor forma.

Quais são os procedimentos utilizados na reabilitação de uma mina abandonada?
Os procedimentos englobam várias etapas. Sem a preocupação de pormenorizar, elas incluem, primeiro que tudo os estudos detalhados de caracterização geológica, geoquímica, hidrogeológica, geotécnica, etc. Seguem-se a elaboração dos projectos de engenharia e as obras. Os projectos são muitos deles sujeitos a EIA antes de passarem à fase da obra propriamente dita.
Cada caso é um caso. As minas de urânio têm, adicionalmente, o problema da radioactividade, o problema dos efluentes, que exigem neutralização, monitorização e controlo para evitar a contaminação do meio envolvente, em particular, dos aquíferos.
Há, também, o impacto visual e a segurança, com as minas a céu aberto, bem como dos resíduos que constituem uma séria preocupação, sendo necessária em muitos casos a sua remoção, encapsulamento e isolamento das águas superficiais, preservando-os em locais seguros para pessoas e para a envolvente ambiental.
Outro caso, é o das minas com sulfuretos, por gerarem as denominadas águas ácidas. Estas águas por onde passam podem contaminar os solos, a rede hidrográfica superficial e as águas subterrâneas necessitando, por isso, também, um tratamento especial.
É necessário encontrar sempre uma forma de valorizar a zona, de a equilibrar em termos ambientais e de segurança e encontrar a melhor forma de enquadramento paisagístico. Por fim, entra-se na fase de monitorização específica para tudo ficar devidamente controlado.

Cada vez mais é necessário que os empresários do sector da indústria extractiva tenham presentes a responsabilidade de se fazerem os projectos ambientais. A EDM também os consciencializa?
Qualquer empresa que queira explorar tem que ter em conta a necessidade de cumprir a lei, a qual é agora muito rigorosa em matéria ambiental, em particular nos países da UE. O papel directo da EDM aqui não tem cabimento. Porém, o exemplo das obras de reabilitação realizadas no âmbito da concessão ambiental, a especialização de técnicos e das várias empresas envolvidas nos projectos, podem ser um factor indutor de boas práticas ambientais, sem dúvida.
A consciencialização deste facto e a maior sensibilização da generalidade das empresas para as questões ambientais levam a que, hoje em dia, mesmo nos países mais tolerantes, as boas empresas façam gabarito em se apresentarem como amigas do ambiente. Ou seja, como empresas-cidadãs. Esse facto acaba por ser, em muitas situações, uma importante e decisiva vantagem competitiva, pelo menos no mundo desenvolvido e, agora, cada vez mais, também, nos países em vias de desenvolvimento e, até mesmo, nos economicamente menos desenvolvidos.

Com todas estas características positivas no sector mineiro, Portugal está ao nível dos restantes países da Europa em termos de prospecção e pesquisa?
Muita prospecção já foi feita e de nível internacional pelos serviços do Estado e por empresas, designadamente a EDM. Os êxitos alcançados são bem disso prova. Seguramente, não ficamos atrás neste domínio.
A potencialidade geológica portuguesa é muito boa e estamos bem posicionados em termos de recursos minerais. O nosso exíguo território foi dotado de jazigos de classe mundial, tais como Neves Corvo e Panasqueira. Aljustrel é também um grande depósito de sulfuretos maciços polimetálicos à escala mundial. Ora tudo isto, num país tão pequeno, é muito bom. Possuímos ainda recursos geológicos interessantes aguardando melhor oportunidade para a sua exploração e, como é sabido, dispomos de potencialidade para novas descobertas. O facto de haver empresas, mesmo sendo juniores, a prospectarem em Portugal, isso só corrobora o que temos vindo a dizer. O nosso País continua a oferecer boas potencialidades no sector mineiro. Note-se que actualmente, por todo o mundo, a prospecção mineira é, pelo menos nas fases iniciais dos projectos, cada vez mais desenvolvida pelas empresas júnior, e não pelas «majors».
O grau de exigência ambiental, os altos salários e a moeda forte, constituem três desvantagens competitivas de peso para os países da UE face a outros, em especial africanos, asiáticos e sul-americanos. Importará então perguntar, sendo assim porque é que essas empresas continuam a vir para Portugal? Certamente que não vêm para gastar dinheiro com risco desmedido, mas sim porque, efectivamente, temos boa favorabilidade geológica para novas descobertas de recursos. Esta é uma reflexão que deixo para os mais cépticos.

Portugal poderá voltar a ter o passado mineiro antes desenvolvido?
Portugal tem, inequivocamente, um muito honroso passado mineiro. Não interessa fazer comparações, obviamente. Importará sempre contextualizar o que se analisa. Todavia, é bom que se diga que não é pelo facto das minas activas se terem reduzido a escasso número que se pode deduzir que o sector entrou em decadência e que está tudo feito. Pelo contrário. Se é um facto que Portugal tinha muitas minas, não é menos verdade que elas eram, na sua esmagadora maioria, de tamanho reduzido e significado económico diminuto. Medir a importância do sector só pelo número de minas, não passa de exercício falacioso. Obviamente, pode ser muito mais importante possuir uma mina como a de Neves Corvo do que ter dezenas ou mesmo centenas de pequenas explorações como muitas do passado.
Essa ideia errada teve, como não podia deixar de ser, repercussões bastante negativas para o sector. Efectivamente, o valor bruto da produção anual da indústria extractiva ultrapassa já os mil milhões de euros, gerados directamente da Terra. Neves Corvo continua a ser a mais importante mina de cobre e estanho da Europa, é o maior empregador do Baixo Alentejo e um dos maiores exportadores líquidos nacionais. A Panasqueira, como maior mina do mundo de volframite, continua a ser um caso de sucesso. Tudo isso sem falar nos importantes subsectores das rochas ornamentais, das rochas industriais e das águas minerais.
Por outro lado, tal como decorre do que antes foi dito, há que enfrentar agora os novos desafios que se colocam em matéria de prospecção mineira, pois será daí que deverá surgir novo alento para o sector com o aumento da nossa base de reservas e importante contributo para a economia do País. A prospecção está sempre condicionada pela potencialidade das áreas mineiras e pelo problema da profundidade. Sem grande risco de errar pode-se afirmar que, em boa verdade, à excepção do carvão e do ferro, não há praticamente nenhuma província mineira no país que se possa considerar totalmente prospectada. Estou, pois, confiante para o futuro que se avizinha para a indústria extractiva. Haverá que continuar a trabalhar para o desenvolvimento do sector, junto de quem tenha capacidade e noções claras de como o fazer, com empenho, determinação e qualidade.
É curioso constatar que lá fora são países com intensa actividade mineira e onde a enorme potencialidade geológica só por si seria suficiente para atrair investimentos, casos do Canadá e da Austrália, que mais se esforçam em promover e em apoiar, com incentivos e, inclusive, partilha de risco, os projectos de prospecção mineira. Outro motivo sério de reflexão que aqui também deixamos.
Mas, não haja ilusões. As descobertas num país mineiramente antigo, tanto podem levar meses como vários anos para terem lugar. Todavia, para que isso possa acontecer é, desde logo, condição sine qua non que haja actividade relevante e persistente com tal objectivo.

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